1. INTRODUÇÃO
A FGV já pediu apelação em oito edições do Exame de Ordem. Como é uma peça com grande probabilidade de cair novamente, veremos todas as principais hipóteses de cabimento, em uma série de cinco posts.
O nosso primeiro objeto de estudo será a apelação contra absolvição sumária ou impronúncia do rito do júri. Entenda: no final da primeira fase do rito do júri, o magistrado pode pronunciar, impronunciar ou absolver sumariamente o réu. Contra a impronúncia ou absolvição sumária, a peça cabível é a apelação, com fundamento no art. 416 do CPP Art. 416. Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação.. No entanto, você deve estar se perguntando: por qual motivo o réu apelaria da absolvição ou da impronúncia? O MP que apele, não é mesmo?
Pensando nisso, a FGV, no VII Exame de Ordem, sabendo que ninguém estaria preparado para enfrentar uma situação dessas, exigiu que o candidato elaborasse uma apelação, na condição de assistente de acusação, contra a sentença de absolvição sumária do réu. É claro, na época, foi a maior confusão! Nenhum cursinho conseguiu prever uma peça dessas, e muita gente acabou reprovada por interpor recurso em sentido estrito em defesa do acusado. Não acredito que a FGV repita a hipótese, mas é bom estar preparado.
2. FUNDAMENTO LEGAL
A peça está prevista nos arts. 416 Art. 416. Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação. e 598 do CPP Art. 598. Nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo.. A FGV exigiu os dois dispositivos.
3. TESES DE DEFESA
O seu objetivo será o afastamento das hipóteses de absolvição sumária, do art. 415 do CPP Art. 415. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: I – provada a inexistência do fato; II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal; IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. , e a demonstração de que há provas suficientes para a pronúncia do réu.
4. COMO IDENTIFICAR A PEÇA
O problema dirá que houve sentença de impronúncia ou de absolvição sumária e deixará bem claro que você advoga contra o réu e em favor da vítima. Ademais, uma outra situação é possível: o juiz absolveu sumariamente o réu pela inimputabilidade (absolvição imprópria), mas havia outra tese de defesa, mais favorável. Neste caso, é de interesse dele, acusado, a reforma da sentença
5. PRAZO
Caso ainda não esteja habilitado, são 15 dias para interposição (CPP, art. 598, parágrafo únicoParágrafo único. O prazo para interposição desse recurso será de quinze dias e correrá do dia em que terminar o do Ministério Público.), contados do fim do prazo do MP, e 3 dias para razões (CPP, art. 600, § 1º § 1º Se houver assistente, este arrazoará, no prazo de três dias, após o Ministério Público.).
6. PEDIDO
A pronúncia do réu.
7. MODELO DE PEÇA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA … VARA DO JÚRI DA COMARCA …
Obs.: como se trata de crime doloso contra a vida, a competência é da vara do júri. No entanto, pode acontecer de o caso ter ocorrido em uma cidade do interior, onde há uma única vara criminal. Neste caso, a peça deve ser endereçada a este juízo. Fique atento ao que diz o enunciado e não invente informações.
JOSÉ, ascendente de MARIA, parte legítima para assistir à acusação, com fundamento nos arts. 268 Art. 268. Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no art. 31. e 31Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. do Código de Processo Penal, vem, por seu advogado (procuração anexada), com fundamento nos arts. 416 e 598 do Código de Processo Penal, requerer a HABILITAÇÃO como assistente de acusação e interpor APELAÇÃO.
Obs.: a FGV aceitou a habilitação em peça autônoma e na própria interposição. No gabarito, disse o seguinte: “Acerca desse item, cumpre salientar que será atribuída a pontuação respectiva se o pedido de habilitação tiver sido feito em peça apartada.”. Entretanto, convenhamos: é inviável elaborar uma peça de habilitação, outra de interposição e as razões. Como o importante é que você fale da habilitação, mencione-a no corpo da interposição. Ademais, fique atento à fundamentação: arts. 416 e 598 do CPP.
Requer seja recebida e processada a apelação e encaminhada, com as inclusas razões, ao Tribunal de Justiça.
Pede deferimento.
Comarca, data.
Advogado.
Obs.: muito cuidado com o prazo do art. 598, parágrafo único, do CPP.
Razões de Recurso de Apelação (CPP, art. 600, § 1º)
Apelante: José.
Apelado: Francisco.
Egrégio Tribunal de Justiça,
Colenda Câmara,
Douto Procurador de Justiça,
José, na condição de assistente de acusação, não conformado com a sentença que impronunciou o réu Francisco, proferida pelo Juiz de Direito da … Vara do Júri da Comarca …, requer a reforma da decisão pelas razões a seguir expostas
Obs.: mencionei o art. 600, § 1º, caso conste no gabarito.
I. DOS FATOS
No dia 20 de março de 2016, Maria, filha do apelante, foi morta a facadas na Av. dos Imigrantes, na cidade de …. Embora ninguém tenha sido preso em flagrante, dias após o ocorrido, a testemunha Raimunda foi à delegacia e relatou que o crime foi praticado por Francisco, seu cunhado. Segundo ela, no dia dos fatos, Francisco chegou em casa com a roupa suja de sangue, e afirmou que havia “matado uma mulher na Av. dos Imigrantes por quase tê-lo atropelado” (fl. xxx). A testemunha disse que, em um primeiro momento, pensou que o cunhado estava mentindo, mas, no dia seguinte, ao ver notícias sobre um homicídio ocorrido na Avenida dos Imigrantes, concluiu que Francisco havia praticado o delito. Em juízo, a testemunha confirmou o relato (fl. xxx).
O réu, Francisco, negou a autoria durante a fase policial e em juízo. Disse que, no dia dos fatos, por estar bêbado, caiu enquanto andava em sua bicicleta, e que por isso estaria sujo de sangue. Ademais, disse que ouviu pessoas falando sobre o homicídio no bar em que estava, localizado próximo à Avenida Imigrantes, e que resolveu fazer uma “brincadeira” (fl. xxx) com sua cunhada, Raimunda, ao dizer ser o autor do delito.
A testemunha de nome Antônio, ouvida somente na fase policial, pois não foi mais encontrada, disse que o homicida vestia bermuda jeans e camiseta de cor amarela. Segundo Raimunda, na data do ocorrido, Francisco vestia bermuda jeans e camiseta, mas não se recorda da cor.
Com base nos relatos das testemunhas, o Ministério Público ofereceu denúncia contra Francisco, com fundamento no art. 121, § 2º, II do Código Penal Art. 121. Matar alguem: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. (...) § 2° Se o homicídio é cometido: (...) II - por motivo futil;. Entretanto, o juiz impronunciou o acusado por entender ausentes indícios mínimos de autoria. O promotor de justiça não recorreu da decisão.
Obs.: no tópico “dos fatos”, apenas resuma o enunciado. Não é o momento para alegar teses.
II. DO DIREITO
Como se vê, Excelências, o réu não deveria ter sido impronunciado. Embora o magistrado tenha dito, em sua sentença, não estar convencido da autoria, há indícios suficientes para a pronúncia do acusado. A testemunha de nome Raimunda traz, em seus dois relatos, dúvidas suficientes para que os fatos sejam julgados pelo Conselho de Sentença, com fundamento no art. 413 do CPP Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação..
Ao impronunciar o acusado, o magistrado usurpou a competência do Tribunal do Júri para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, prevista no art. 5º, XXXVIII, “d”, da Constituição Federal.
Obs.: no exemplo, tratei apenas da impronúncia. Quando caiu um caso semelhante no VII Exame de Ordem, a FGV trouxe hipótese de absolvição sumária, do art. 415 do CPP.
III. DO PEDIDO
Diante do exposto, requer seja conhecido e provido o recurso, para que seja reformada a sentença e o réu seja pronunciado pela prática do crime de homicídio qualificado, previsto no art. 121, § 2º, II, do Código Penal.
Obs.: não se esqueça de mencionar o delito e fundamentá-lo.
Pede deferimento.
Comarca, data.
Advogado.
Obs.: veja se o enunciado pede para que a peça seja datada no último dia de prazo. Ademais, lembre-se que o prazo para razões é de 3 dias (art. 600, § 1º, do CPP).