O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no ano de 2020, por ocasião do julgamento do REsp 1689187/RJ, analisou a possibilidade da alienação de unidade produtiva isolada de forma diversa prevista dos artigos 60 e 142, da Lei 11.101/2005.
Primeiramente, vale destacar que o Tribunal Superior analisou essa questão em momento anterior ao advento da Lei n. 14.112/2020, norma que alterou consideravelmente a legislação falimentar, conferindo nova redação ao mencionado art. 60.[1]
Como regra, bem pontuada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a alienação de unidades produtivas isoladas da pessoa jurídica que se encontra em recuperação judicial deve-se dar por meio de hasta pública. No entanto, de forma excepcional e, desde que justificada na proposta apresentada aos credores, a alienação pode ocorrer nos termos do antigo art. 145, da Lei n. 11.101/2005, conforme análise feita no julgamento do recurso especial em destaque. Atualmente, o art. 142, IV e V, da Lei n. 11.101/2005, contemplam a possibilidade de a alienação de bens da pessoa jurídica ocorrer por meio de outra modalidade ou processo competitivo organizado promovido por agente especializado e de reputação ilibada.
Percebe-se que o leilão eletrônico, presencial ou híbrido, não é, apenas, a única possibilidade de alienação que a Lei n.11.101/2005 prevê atualmente. Mas, como mencionado, a análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é anterior à novidade legislativa. Naquela época, em maio de 2020, a possibilidade de alienação de unidade produtiva de forma isolada, no caso concreto analisado, foi validada.
A partir disso, analisando o art. 133, do Código Tributário Nacional (CTN), que trata sobre responsabilidade tributária na hipótese de alienação judicial, uma dúvida surgiu: o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus, eximindo o arrematante das obrigações tributárias do devedor, inclusive nas de natureza tributária, mesmo ocorrendo a alienação de outra forma que não seja a judicial?
Na antiga redação do art. 60, da Lei n. 11.101/2005, assim como, na atual redação, a norma é expressa ao se referir à alienação judicial, não contemplando, portanto, as demais formas de alienação dos bens da pessoa jurídica que se encontra em recuperação judicial. Também prevê assim o §1º, do art. 133, do CTN.
Essa questão é de extrema relevância, ainda mais diante da análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme foi exposta.
Embora haja, no Direito Tributário, uma cultura de interpretação literal, neste caso, defende-se a ideia de que mesmo se tratando de uma alienação que não seja judicial, não é possível responsabilizar o adquirente pelos tributos devidos referentes a unidade adquirida. Isso porque, acaso fosse diferente, não haveria interessados na aquisição do bem e, consequentemente, contrariando o princípio da preservação da empresa, além de frustrar a recuperação judicial, uma vez que a finalidade principal desse instrumento é a satisfação dos créditos dos credores e a possibilidade da reestruturação da empresa para que continue a exercer a sua função social: gerar empregos e movimentar o mercado econômico.
Portanto, mesmo quanto aos tributos federais, defende-se a posição de que não seja configurada a referida responsabilidade tributária do art. 133, do CTN. Esse apontamento é indispensável, uma vez que a Lei n. 11.101/2005 prevê que a alienação por outras formas, sem ser a por hasta pública, seja aprovada pela maioria dos credores da pessoa jurídica e, posteriormente, homologada pelo juiz – um juiz estadual!
[1] Antes da promulgação da Lei n. 14.112/2020, a redação do art. 60, da Lei n. 11.101/2005 era a seguinte: “Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei. Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei.” Atualmente, o mesmo artigo prevê que: “Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei. Parágrafo-único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020)”