Para o adequado desempenho das suas atribuições constitucionais, o Ministério Público precisa estar atento e em sincronia com as transformações sociais e tecnológicas da sociedade que representa. Assim, merece atenção a notíciahttps://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/07/22/em-teste-desde-2016-doria-volta-a-anunciar-mais-cameras-para-uniformes-de-policiais-militares.ghtml de aquisição, pelo Governo do Estado de São Paulo, de 2.500 câmeras portáteis acopláveis ao uniforme de policiais militares.
A medida não é pioneira: já em janeiro de 2017, o Governo do Estado de São Paulo investira R$ 271.000,00 em câmeras a serem acopladas a viaturas e aos coletes de policiais militares para a filmagem de ocorrências.
À época, dissehttp://www.policiamilitar.sp.gov.br/noticias/noticia-interna/2017/1/190/Policia-Militar-recebe-573-novas-viaturas o governador Geraldo Alckmin: “Será feito um teste com 120 policiais. Eles levarão em suas fardas uma câmera que irá gravar sua atuação. Estamos começando na área central. Esse é o futuro da polícia, você tem tudo documentado e total transparência”.
O fato foi amplamente divulgadohttp://g1.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/videos/v/pms-de-sp-vao-usar-cameras-acopladas-ao-corpo-para-filmar-acao-durante-patrulhamento/5568297/ https://www.sbt.com.br/jornalismo/sbtbrasil/noticias/85053/SP-Policiais-comecam-a-usar-cameras-acopladas-aos-coletes.html na grande mídia, bem como em sites especializadoshttp://www.portaldaseguranca.com.br/Noticia/Visualizar/4791:
“As câmeras utilizadas gravam áudio e permitem fazer imagens inclusive à noite. Tiram fotos e são resistentes a água. Possuem capacidade para até 20h de gravação e sua bateria suporta até 10hs de imagens.
O sistema é criptografado, ou seja, o conteúdo não pode ser apagado da própria câmera e como possuem GPS, os aparelhos também indicarão a localização exata do policial.
Essas imagens vão ajudar a esclarecer dúvidas sobre a ação policial durante os confrontos, resultando em maior transparência nas ações policiais, inibindo ou confirmando se houve ou não excessos no atendimento das ocorrências funcionando como um mecanismo para coibir desvios de conduta.
Além disso, as gravações poderão ser utilizadas como prova junto a corregedoria ou até mesmo nos tribunais, demonstrando que a ação da equipe foi correta diante de uma possível denúncia de irregularidade.
Por fim, através das imagens será possível aperfeiçoar as técnicas utilizadas pela equipe aprimorando os treinamentos e a formação dos policiais. (…)
Em São Paulo elas já começam a ser utilizadas nos próximos dias e serão distribuídas inicialmente na região central da cidade, por quatro comandos da corporação: Centro, Trânsito, Choque e Ambiental.
As imagens geradas serão gravadas em tempo real no CPD (Centro de Processamento de Dados) da Polícia Militar e guardadas por 30 dias. (…)
Todos os testes e treinamento necessários para a operação foram fornecidos pela Alpha Secure a Polícia Militar de São Paulo e foram concluídos na primeira quinzena de Janeiro/2017.”
Popular nos EUA e vários países europeus, as câmeras de monitoramento em viaturas e coletes já são utilizadas no Brasil há pelo menos seis anoshttp://g1.globo.com/fantastico/noticia/2012/12/cameras-acopladas-aos-policiais-gravam-acoes-nas-ruas.html, sendo atualmente empregada no Distrito Federalhttps://www.agenciabrasilia.df.gov.br/2012/12/03/uso-de-cameras-em-operacoes-rotam-fotos/, Rio de Janeirohttps://www.tecmundo.com.br/oculos/52977-policiais-do-bope-usarao-oculos-especiais-para-ocupar-favela-no-rio.htm, Rio Grande do Sulhttp://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2016/03/policiais-militares-de-11-cidades-do-rs-vao-passar-gravar-ocorrencias.html e Santa Catarinahttp://www.pm.sc.gov.br/noticias/lancamento-do-projeto-piloto-copcast-de-cameras-pessoais-e-realizado-em-tubarao.html, bem como no âmbito federalhttp://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2013/12/prf-usara-pequenas-cameras-para-gravar-abordagens-de-policiais-no-rs.html. A inovação vem sendo incentivada pela Human Rights WatchHuman Rights Watch. “O bom policial tem medo” (2016). Disponível em https://www.hrw.org/pt/report/2016/07/07/291589).
Em São Paulo, o Dep. Jorge Caruso (PMDB) é autor do Projeto de Leihttps://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1323674 Nº 578/2016, que propõe tornar “obrigatória a instalação de câmeras de vídeo e de áudio nas viaturas automotivas que vierem a ser adquiridas para servir as áreas de Segurança Pública e Defesa Civil” sob a seguinte justificativa:
“Enfrentamos um momento delicado. Com acerto, os adeptos ao discurso sobre direitos humanos e críticos da violência policial cobram providências e punição àqueles que desrespeitam o cidadão. Por outro lado, grande parte da sociedade (possivelmente a maior parte dela), cobra medidas rígidas e extremas contra os criminosos, pouco importando a forma como os mesmos são combatidos, dentro ou não da legalidade, cansada de ter seus direitos violados, ver vidas ceifadas, agonizando à espera de uma comunidade segura. Um desejo legítimo, sem dúvida.
Todos buscam uma Cidade, um Estado, um País melhor, seguro, educado, humano. E anos e anos talvez tenham que ser vividos para que consigamos uma sociedade mais justa e perfeita.
Ante porém a necessidade imediata de soluções que ajudem a dirimir questões, evitar abusos, justificar atos, entendemos que se faz necessário equipar as instituições para que provas sejam produzidas, a demonstrar de forma transparente a conduta dos agentes policiais e registrar, de igual sorte, a conduta de indivíduos suspeitos e que transgridam a lei.
Apresentamos portanto esse projeto, baseado em iniciativa semelhante no Estado do Rio de Janeiro, que originou a Lei n. 5588 de 2009 naquele local, para que, ao se equipar as viaturas policiais com câmeras de vigilância, possamos dar transparência ainda maior à ação dos agentes de segurança pública, gerando prova a fim de poder determinar a licitude e ilicitude das ações de todas as partes envolvidas. É uma medida de auxílio a toda a sociedade”.
Em 23/07/2020, foi publicadoDiário Oficial do Estado, Poder Executivo - Seção I, p. 52. o edital do Pregão Presencial Internacional DTIC Nº PR-183/0012/20, no valor global de R$ 7 milhões, “objetivando a contratação de prestação de serviços de empresa especializada para a solução integrada de captação, armazenamento, custódia e gestão de evidências digitais por câmeras operacionais portáteis nas atividades policiais, com o fornecimento Body-Worn-Camera (Câmera Operacional Portátil), em regime de comodato, conforme o PROJETO BÁSICO Nº DTIC-001/313/20”.
A novidade deve ser comemorada: o registro audiovisual da ocorrência eleva a outro patamar a investigação e a instrução processual penal, hoje fortemente dependente do testemunhoSobre o tema: STEIN, Lílian Milnitsky e NYGAARD, Maria Lúcia Campani. A memória em julgamento: uma análise cognitiva dos depoimentos testemunhais. Revista do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 151-164. dos policiais, com a falibilidade que é inerente a esse tipo de prova.
A inovação também favorece a negociação de acordos de não-persecução penal, já que os registros audiovisuais que instruirão a investigação modificam significativamente as posições negociais do averiguado e do órgão acusatório, alterando a importância da confissão conforme o caso concreto.
O mecanismo é valioso não apenas na formação da opinio delicti, mas também no controle externo da atividade policial e na tutela dos direitos humanos, pois contribui para a apuração e correto encaminhamento de denúncias de omissão, violência, corrupção, abuso e letalidade policial, que, embora não preponderem na atuação da PM, ameaçam a ordem democrática e a credibilidade do sistema de segurança pública, nele incluído o sistema de Justiça. São oportunas as ponderações de NucciNucci, Guilherme de Souza. Direitos humanos versus segurança pública. Rio de Janeiro: Forense, 2016. sobre o tema:
“A segurança pública é o reflexo da própria sociedade que tanto a deseja. O Direito Penal é um símbolo da legalidade e da presença estatal para coibir o crime. Não significa que o operador do Direito é um super-herói, conseguindo sempre sucesso no combate ao delito.
Abandonando essa ideia ingênua, todos devem raciocinar e extrair o verdadeiro papel da polícia e da segurança pública em geral. Por isso, os direitos humanos não atrapalham em nada o trabalho policial. Podem, sim, incomodar o mau policial, que pretende abusar do seu poder, ingressando no universo criminoso.
A comunidade deve enxergar os direitos humanos como aliados contra qualquer forma de opressão. Matar bandidos, como muitos pensam ser viável, é simplesmente um crime. Não há pena de morte no Brasil e, mesmo que houvesse, deveria ser decretada após o justo processo legal. Se o policial extermina um pretenso bandido, cuida-se de homicídio. O apoio eventualmente recebido de parcela da comunidade é um desabafo coletivo de desgosto em face dos elevados índices de criminalidade. Pode ser compreensível, mas não justificável. Um bandido morto não é um bandido a menos, mas um crime a mais, elevando os índices de cometimento de delitos naquela localidade.
A violência excessiva não atrai a ordem pública; ao contrário, fomenta a desordem, pois ela pode atingir um inocente e gerar revolta de uma parte da população contra o organismo institucional criado para protegê-la. (…) É ou corrupto, pois se está, na essência, fomentando a desordem pública, bem como incentivando a insegurança. É esse profissional da polícia que se pretende chamar quando se estiver em dificuldade? Quer-se uma polícia limpa para trazer ordem – e não para fomentar a desordem e concretizar atos ilegais e abusivos”.
E também sob a perspectiva das próprias instituições policiais, resta claro que a novidade é extremamente benéfica. O registro integral da ocorrência permite analisar a eficácia das abordagens policiais, aperfeiçoar as técnicas praticadas, apurar eficazmente denúncias de abusos. No mais, é útil como fonte de dados para planejamento de operações, cursos e treinamentos, bem como favorece a defesa dos próprios agentes contra acusações injustas.
Revisando estudo realizado nos Estados Unidos pelo Instituto das Comunidades Orientadas para Serviços Policiais (COPS) sobre a implementação das câmeras individuais, Silva e CamposSilva, Jardel da e Campos, Joamir Rogerio. Monitoramento das ações policiais por meio do uso de câmeras de porte individual: uma análise de sua utilização nas atividades operacionais. Revista Ordem Pública v. 8, n. 2, jul./dez., 2015, p. 238. (2015) anotam:
“O responsável pela pesquisa foi o Dr. Michael D. Branca, que a justifcou pela falta de estudos disponíveis sobre a tecnologia e elencou 5 estudos aos quais atribuiu o caráter de empíricos, mas nem por isso menos importantes:
1. Plymouth Bodycam Projecto (Inglaterra, Goodall, 2007);
2. São Paulo – SP/Aberdeen (Escócia, ODS Consulta, 2011);
3. Rialto (Califórnia), Departamento de Polícia (FARRAR, 2013);
4. Mesa (Arizona), Departamento de Polícia (DPM, 2013);
5. Phoenix (Arizona), Departamento de Polícia (White, 2013).
A seguir, serão apresentados os benefícios, bem como sua testagem pelos estudos citados anteriormente:
• As câmeras individuais aumentam a transparência das ações policiais, evidenciando a legitimidade da ação para o cidadão. Esse aspecto quase não foi testado, pois não existe estudo que tenha verificado as opiniões dos cidadãos.
• Câmeras individuais têm um efeito civilizador, resultando em um melhor comportamento entre os agentes de polícia e os cidadãos. Assim, em Rialto, Mesa, Plymouth, e São Paulo – SP/Aberdeen, houve diminuição das queixas por parte dos cidadãos, bem como no uso da força por parte da polícia (Rialto) e agressões a funcionários (Aberdeen).
• As câmeras junto ao corpo diminuem as queixas dos cidadãos e têm como benefício acelerar a resolução das queixas, pois melhoram as provas para detenção e acusação. Não existe nenhuma pesquisa que tenha testado o impacto da tecnologia em processos judiciais contra policiais
• Câmeras individuais proporcionam oportunidades para o treinamento da polícia. Trata-se de uma alegação em sua maioria ainda não testada.
Como desvantagens para implementação, existe uma série de fatos que deixaram de ser abordados pelas pesquisas ou que foram relatados como riscos para implementação, o que não necessariamente se constitui em algo que contraindica o uso de câmeras individuais, pelo contrário, sugere que as próximas pesquisas de campo abordem tais fatos de forma aprofundada, sendo tais fatos: preocupações com a privacidade, tanto com os cidadãos como com os policiais; preocupações com a saúde dos agentes, pois tais equipamentos podem causar lesões a curto, médio e longo prazo, em função do local do corpo escolhido, de incidentes, do vazamento de fluídos, dentre outros riscos (GOODALL, 2007 apud BRANCA, 2014); e aspectos de treinamento para uso e necessidade de aperfeiçoamento quanto à produção de provas e aos grandes impactos fnanceiros, nem sempre suportados (BRANCA, 2014)”.
Ao final, ponderam:
“Embora a maior parte das críticas cite a videomonitoração como um todo, não há críticas específicas dirigidas às câmeras individuais, o que se torna um detalhe estratégico para considerar as câmeras corporais como alternativa de vigilância menos “opressora” ou menos “violadora do direito a liberdade e privacidade”. Constata-se também que há maior aceitação da população, pois, durante a abordagem, a câmera servirá também como elemento para assegurar a garantia dos direitos fundamentais.
Causa uma sensação de segurança ímpar no cidadão, pois dificilmente sofrerá abuso de autoridade com uma câmera ligada.
Tem-se que considerar que recursos humanos e logísticos deixarão de ser utilizados em grandes números nas unidades de correição, bem como se reduzirá o tempo despendido com processos disciplinares, já que, diante de prova irrefutável de inocência do policial, algumas denúncias poderão ser arquivadas ainda na sindicância ou até antes disso”.
Mas, se por um lado exalta-se a inovação, diversos debates iniciam-se a partir da notíciahttps://motherboard.vice.com/pt_br/article/ypxmmx/sorria-as-fardas-dos-policiais-militares-estao-te-filmando. Sob a perspectiva ministerial, entendemos imprescindível perquirir:
• O programa conta com participação da sociedade civil organizada? Quais órgãos públicos participaram da sua elaboração?
• O Ministério Público de São Paulo possui cópia do projeto? A Administração Superior do MPSP já emitiu alguma nota técnica ou orientação a respeito?
• Quais foram os critérios para seleção das unidades policiais a receberem os aparelhos?
• Quais as diretrizes adotadas para proteção da privacidade dos envolvidos?
• Que mecanismos asseguram a integridade dos registros? É mesmo impossível apagar ou alterar imagens?
• Na lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, o policial militar condutor possui o dever funcional ou está instruído a informar à autoridade policial a existência de registro audiovisual da ocorrência? Há discricionariedade da Polícia Militar em fornecer as imagens ao Poder Judiciário e Ministério Público? Cabe a estes órgãos diligenciar para verificar se o caso apresentado à Justiça conta com registro audiovisual do fato?
• Há perspectiva de projeto semelhante no âmbito da Polícia Civil do Estado de São Paulo?
A nosso ver, o ponto mais crítico do projeto consiste na faculdadehttps://exame.com/brasil/pms-terao-controle-para-ligar-e-desligar-cameras-corporais-em-sp/ concedida aos policiais militares, de ligar e desligar as câmeras, a seu critério, durante os trabalhos:
“Por uma decisão do governo, o acionamento dos equipamentos durante um atendimento policial não será automático nem gerenciado pelo Centro de Operações da PM (Copom). O comando da polícia acredita que assim haverá menos resistência por parte dos policiais no uso do equipamento.
(…)
No entanto, quando perguntados por que as câmeras não seriam distribuídas prioritariamente em unidades da PM com altos índices de letalidade policial, o governador e autoridades da Segurança Pública estadual disseram que o programa não foi criado prioritariamente para o enfrentamento da violência policial.
— Não é câmera para evitar a letalidade. Isso não tem relação. A câmera é para mostrar o grande trabalho feito pelo policial. A imagem ficará totalmente, sem edição, à disposição do advogado, delegado, promotor e juiz — disse o secretário-executivo da Polícia Militar de SP, Alvaro Camilo”.
De forma injustificada e contrária à própria ratio do projeto de lei correlato, tal prerrogativa limita a utilização das câmeras aos eventos cujo registro se mostrar conveniente ao próprio policial, neutralizando boa parte dos avanços anteriormente destacados na seara do controle externo da atividade policial, da tutela dos direitos humanos e da probidade administrativa.
De fato, a prerrogativa unilateral de acionar a câmera durante a ocorrência apenas reforça a assimetria natural entre o agente estatal e o particular abordado.
Veja-se que, em maio de 2019, a Promotoria de Justiça de Direitos Humanos – Inclusão Social da Capital, ajuizouhttp://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/noticias/noticia?id_noticia=20570014&id_grupo=118 ação civil pública buscando a adoção das “providências necessárias a eliminar ou reduzir acentuadamente os índices de letalidade policial – de policiais que matam e de policiais que morrem – decorrentes das ações policiais, em prazo razoável e a partir de diagnósticos e estudos cientificamente embasados em dados de monitoramento da atividade policial”. Dentre os pedidos, incluíam-se:
“2. A condenação do Estado a instalar equipamentos de localização por satélite (GPS), em todas as viaturas da Polícia Civil e da Polícia Militar.
3. A condenação do Estado a instalar equipamentos de escuta e gravação ambiental em todas as viaturas da Polícia Civil e da Polícia Militar.
4. A condenação do Estado a implantar o registro de tais informações em programas (software) que não permitam edição ou acesso por terceiros para manejo dos dados.
5. A condenação do Estado a proibir, por normas administrativas das Polícias ou da Secretaria de Segurança Pública, de que qualquer viatura deixe a unidade policial sem que estejam acionados o operantes os equipamentos de localização por satélite e de escuta e gravação ambiental.
6. A condenação do Estado a instalar, no âmbito das instituições policiais, equipamentos que garantam a conservação dos mapas e relatórios dos deslocamentos das viaturas captados por GPS, em condições adequadas para consulta, pelo prazo mínimo de dez anos.
7. A condenação do Estado a instalar, no âmbito das instituições policiais, equipamentos que garantam a conservação dos áudios captados pelo sistema de gravação ambiental em viaturas, em condições adequadas para consulta, pelo prazo mínimo de dez anos.
8. A condenação do Estado a que providenciar que sejam realizadas gravações de todas as ações de policiais militares e de policiais civis em vias e logradouros públicos, a partir de câmera fixada no colete dos agentes.
9. A condenação do Estado a providenciar que a gravação dessas operações seja criptografada, impedindo-se qualquer tipo de edição.
10. A condenação do Estado a que promova a proibição, por norma administrativa das Polícias ou da Secretaria de Segurança Pública, de que os policiais militares e policiais civis realizem ações em logradouros públicos sem que a câmera de registro esteja devidamente operante.
11. A condenação do Estado a remeter cópias dos arquivos eletrônicos tratados nos itens anteriores, para armazenamento, a cada dois dias, ao Ministério Público do Estado de São Paulo e à Ouvidoria de Polícias.
12. A condenação do Estado a editar norma administrativa, pelas Polícias ou pela Secretaria de Segurança Pública, dispondo sobre as atribuições e responsabilidades dos servidores das unidades policiais para remessa dos arquivos eletrônicos.” (grifos nossos)
Nesse contexto, resta claro que a medida recentemente anunciada teve seu alcance e utilidade significativamente reduzidos pelo governo, sob o questionável argumento de que haveria resistência dos policiais na utilização do equipamento.
Nesse quadro, incumbe ao Ministério Público discutir a razoabilidade e eficiência da medida, que custará R$ 7 milhões ao erário público estadual, mas com limitação significativa de seu alcance prático, sobretudo no controle externo da atividade policial e na tutela dos direitos humanos.
Sobre o tema, nos parecem pertinentes as observações do Presidente Executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus SchwabA quarta revolução industrial, trad. Daniel Moreira Miranda. São Paulo, 1ª ed., Edipro, 2016, p. 73., sobre os efeitos práticos da denominada Quarta Revolução Industrial na Administração Pública:
“Os governos, em sua forma atual, serão forçados a mudar à medida que seu papel central de conduzir a política ficar cada vez menor devido aos crescentes níveis de concorrência e à redistribuição e descentralização do poder que as novas tecnologias tornam possíveis.
Cada vez mais, os governos serão vistos como centros de serviços públicos, avaliados por suas capacidades de entregar seus serviços expandidos de forma mais eficiente e individualizada. Em última análise, a capacidade de adaptação dos governos irá determinar sua sobrevivência.
Eles resistirão se abraçarem um mundo de mudanças exponencialmente disruptivas e se submeterem suas estruturas aos níveis de transparência e eficiência que podem ajudá-los a manter suas vantagens competitivas”.
Pela relevância e atualidade, entendemos que a abordagem de tais questões é absolutamente necessária ao promotor de Justiça, para que o sistema de segurança pública avance na consecução dos seus objetivos constitucionais.