Informativo: 663 do STJ – Processo Penal
Resumo: Não é cabível a realização de audiência de custódia por meio de videoconferência.
Comentários:
A audiência de custódia é uma cautela que atende, basicamente, à Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 7.5). No mesmo sentido, o art. 9.3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York. Por meio da audiência de custódia, ato solene de apresentação do preso, o juiz fica frente a frente com o custodiado e apura as circunstâncias objetivas da prisão, sem contudo analisar o mérito.
Em nosso ordenamento, a matéria, até o advento da Lei 13.964/19, estava disciplinada apenas na Resolução n. 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça e em normas internas de tribunais. Atualmente, a audiência é expressa no art. 310 do CPP:
“Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:
I – relaxar a prisão ilegal; ou
II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou
III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”.
Não nos parece que a Lei 13.964/19 superou absolutamente a norma administrativa e a tornou sem efeito. Ao contrário, a Resolução 213/2015 aclara (e muito) lacunas deixadas pela lei. É o caso do art. 13, segundo o qual a audiência deve ser realizada também “em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva”, sendo que os “mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local” (destacamos).
Com fundamento nesta regra, a Terceira Seção do STJ considerou ilegal audiência de custódia realizada por videoconferência após o cumprimento de mandado de prisão preventiva em juízo diverso daquele que havia determinado a prisão:
“A Resolução n. 213 do CNJ é clara ao estabelecer que, no caso de cumprimento de mandado de prisão fora da jurisdição do juiz que a determinou, a apresentação do preso, para a audiência de custódia, deve ser feita à autoridade competente na localidade em que ocorreu a prisão, de acordo com a Lei de Organização Judiciária local.
No caso de audiência de custódia realizada por juízo diverso daquele que decretou a prisão, observa que competirá à autoridade judicial local apenas, caso necessário, adotar medidas necessárias à preservação do direito da pessoa presa. As demais medidas, ou não são aplicáveis no caso de prisão preventiva ou não possui o juízo diverso do que decretou a prisão competência para a efetivar. De fato, uma das finalidades precípuas da audiência de custódia é aferir se houve respeito aos direitos e garantias constitucionais da pessoa presa.
Assim, demanda-se que seja realizada pelo juízo com jurisdição na localidade em que ocorreu o encarceramento. É essa autoridade judicial que, naquela unidade de exercício do poder jurisdicional, tem competência para tomar medidas para resguardar a integridade do preso, bem assim de fazer cessar agressões aos seus direitos fundamentais, e também determinar a apuração das responsabilidades, caso haja relato de que houve prática de torturas e maus tratos. Nesse contexto, foge à ratio essendi do instituto a sua realização por meio de videoconferência.
Registre-se que o Presidente do Conselho Nacional de Justiça, ao deferir a medida liminar para suspender a Resolução CM n. 09/2019, que permitia a realização da audiência de custódia por meio de videoconferência destacou que “o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) considerou que a apresentação pessoal do preso é fundamental para inibir e, sobretudo, coibir, as indesejadas práticas de tortura e maus tratos, pois que a transmissão de som e imagem não tem condições de remediar as vantagens que o contato e a relação direta entre juiz e jurisdicionado proporciona”.
Não se admite, portanto, por ausência de previsão legal, a realização da audiência de custódia por meio de videoconferência, ainda que pelo Juízo que decretou a custódia cautelar” (CC 168.522/PR, j. 11/12/2019).
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados por Artigos