Informativo: 678 do STJ – Processo Penal
Resumo: Não há impedimento ou suspeição de integrantes de Colegiado do STJ que apreciaram recurso especial e, posteriormente, venham a participar do julgamento de outro apelo raro oriundo de revisão criminal ajuizada na origem.
Comentários:
Pressuposto fundamental para a atuação do juiz em determinado processo é sua imparcialidade. Para garanti-la, o art. 252 do CPP elenca situações objetivas nas quais o juiz está impedido de atuar. Pouco importa analisar se, em determinado caso – por exemplo, a defensora do réu ser sua esposa – o juiz manteria a imparcialidade independentemente das circunstâncias. Prefere o legislador que não se faça essa espécie de indagação, razão pela qual, adiantando-se, impede o juiz de atuar, por mais isenta que pudesse ser sua postura.
O inciso III determina o impedimento de quem “tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão”. O objetivo da lei é claro. Não faria sentido que o juiz responsável por proferir a sentença em primeira instância, uma vez promovido ao cargo de desembargador, fosse julgador do recurso contra sua própria decisão anterior; ou que fosse julgar, em segundo grau, habeas corpus ou revisão criminal decorrente de decisão que proferiu quando ainda em exercício em primeiro grau de jurisdição. Em afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição e à manutenção da imparcialidade, esse magistrado tenderia fortemente a manter sua própria decisão. É certo que, em tese, a retratação pode ocorrer, assim como no recurso em sentido estrito, quando, em juízo de retratação, o juiz pode rever sua própria decisão. Também os embargos infringentes ou de nulidade admitem que um desembargador que julgou a apelação em um determinado sentido reformule seu voto quando aprecia o recurso. O legislador, de qualquer forma, preferiu não correr qualquer risco e, prudentemente, impôs a causa de impedimento.
O impedimento, porém, só ocorre no mesmo processo no qual o juiz se pronunciou sobre a questão em julgamento. Assim, não haverá impedimento, por exemplo, caso o juiz criminal tenha atuado em processo cível anterior. Suponha-se que, no cível, o juiz tenha apreciado uma ação de nulidade de título extrajudicial com cancelamento de protesto, determinando, na sentença, que fossem os autos remetidos à polícia para apuração de um crime de falsidade do cheque. O mesmo juiz não está impedido de julgar eventual ação criminal posteriormente deflagrada em virtude desse fato. Tampouco há impedimento do juiz que julgou – e condenou – o réu em determinado processo, para que venha a julgá-lo em outro feito criminal, deflagrado por fato diverso. É comum, aliás, principalmente em comarcas pequenas, que o juiz se depare diversas vezes com o mesmo acusado em processos distintos, e nem por isso se pode afirmar que uma condenação anterior o tornará impedido (ou mesmo suspeito) de julgar a mesma pessoa ainda mais uma vez.
E, ainda quando a atuação tenha sido no mesmo feito, nem sempre há impedimento. Assim, condenado o réu em primeiro grau e anulado o processo em recurso, o mesmo juiz que proferiu a sentença anulada deverá julgar novamente. Da mesma forma, segundo decidiu a Terceira Seção do STJ no AgRg na ExSusp 209/DF (j. 12/08/2020), os ministros de determinada turma que tenham julgado recurso especial não ficam impedidos de julgar outro recurso da mesma natureza contra acórdão proferido em revisão criminal referente aos mesmos fatos. O tribunal concluiu que o impedimento não existe em decorrência de julgamentos da mesma instância e que, inclusive, as regras do regimento interno estabelecem, em situações como aquela levada a julgamento, a competência por prevenção:
“Cinge-se a controvérsia a definir se há impedimento ou suspeição no fato de ter sido distribuído um recurso especial a integrante da Quinta Turma e esse Colegiado venha a ser o competente para apreciar outro recurso especial, desta vez interposto contra acórdão oriundo de revisão criminal originada de ação penal a que dizia respeito o primeiro apelo raro.
O art. 252, III, do Código de Processo Penal estabelece: “Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que: […] III – tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão”.
Assim, veda-se a participação do juiz quando já tiver julgado o processo em outra instância. É o caso, por exemplo, do magistrado que profere a sentença e é promovido ao cargo de desembargador. Nesse caso não poderá participar do julgamento de eventual recurso de apelação, pois estaria, contra o texto legal, apreciando o processo em instâncias diversas. Por outro lado, não ocorre o impedimento quando o julgamento se realiza na mesma instância. Aliás, cuida-se de regra que, nos termos do regimento interno, inclusive gera a prevenção do órgão julgador.
De igual modo, o art. 625 do Código de Processo Penal também não se aplica, já que de revisão criminal não se cuida. Este dispositivo apenas determina que o relator da revisão criminal “não tenha pronunciado decisão em qualquer fase do processo”. Além dessa regra se dirigir precipuamente aos Tribunais de segundo grau, não impede a participação deste desembargador no julgamento, apenas o afasta da condição de relator. Ademais, trata exclusivamente da distribuição de revisão criminal, feito que não tramita nesta Corte. Aqui, o que há é um recurso especial, cuja distribuição se deu de forma aleatória”.
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