Informativo: 673 do STJ – Direito Penal e Processo Penal
Resumo: Compete à Justiça Estadual o pedido de habeas corpus preventivo para viabilizar, para fins medicinais, o cultivo, uso, porte e produção artesanal da Cannabis (maconha), bem como porte em outra unidade da federação, quando não demonstrada a internacionalidade da conduta.
Comentários:
Destina-se o habeas corpus a tutelar a liberdade de locomoção do indivíduo. Protege, pois, o direito de ir, vir, ficar ou voltar. Vê-se, portanto, que se assegura o livre direito de locomoção, o jus manendi, ambulandi, e undi ultro citroque, isto é, o direito de ir e vir para onde quer que se pretenda, mas diretamente relacionado ao indivíduo.
Quando liberatório ou repressivo, o habeas corpus tem por objetivo afastar uma violência ou coação ilegal atual, concreta, presente, que está ocorrendo, como sucede, por exemplo, se alguém se acha preso sem a respectiva ordem judicial e não se trata de flagrante. Se preventivo ou suspensivo, o habeas corpus é impetrado quando há iminência de concretização da violência ou coação ilegal, ou seja, o constrangimento ainda não se verificou, mas está prestes a ocorrer.
Têm sido frequentes os pedidos de salvo-conduto para o cultivo e o consumo de maconha para fins medicinais. Por meio da impetração de habeas corpus preventivo, pede-se que nenhuma medida repressiva seja implementada contra pessoas que pretendem utilizar a droga proibida para fins lícitos. Mas de quem é a competência para apreciar o pedido? Da Justiça Federal ou da Justiça Estadual?
Depende. De acordo com a Terceira Seção do STJ (CC 171.206/SP, j. 10/06/2020), se não há pedido relativo à importação da planta ou a outra conduta de caráter transnacional, a competência é da Justiça Estadual:
“O núcleo da controvérsia consiste em definir a competência para prestar jurisdição na hipótese de habeas corpus preventivo para viabilizar o plantio de maconha para fins medicinais. Os impetrantes objetivam ordem de salvo conduto para que os pacientes possam cultivar artesanalmente a planta Canabis Sativa L, bem como usá-la e portá-la dentro do território nacional com fins terapêuticos.
No caso dos autos, em que os impetrantes objetivam impedir possível constrangimento de autoridades estaduais, quais sejam, o Delegado Geral da Polícia Civil e o Comandante Geral da Polícia Militar, está configurada a competência do juízo estadual de primeiro grau.
Ademais, o pedido em sede de habeas corpus evidencia que os impetrantes não intentam obter ordem judicial para viabilizar conduta transnacional pelos pacientes. Constata-se que o pedido do habeas corpus fala em cultivo, uso, porte e produção artesanal da Cannabis, bem como porte, ainda que em outra unidade da federação, e em nenhum momento indica a intenção de importar a Cannabis.
Não há pedido de importação a justificar a competência da justiça federal. Consequentemente, não há motivo para supor que o juízo estadual teria que se pronunciar acerca de autorização para a importação da planta, invadindo competência da justiça federal. Ademais, o uso medicinal da Cannabis no território pátrio de forma legal, em razão de salvos-condutos concedidos pelo poder judiciário, demonstra a possibilidade de aquisição da planta dentro do território nacional, sem necessidade de recorrer à importação.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme quanto à necessidade de demonstração de internacionalidade da conduta do agente para reconhecimento da competência da justiça federal. Frise-se ainda que o tráfico interestadual não tem o condão de deslocar a competência para a justiça federal”.
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