Os vereadores, por força do art. 29, inc. VIII, da CF/88, desfrutam somente de imunidade absoluta, desde que as suas opiniões, palavras e votos sejam proferidos no exercício do mandato (nexo material) e na circunscrição do município (critério territorial).
A exemplo do que ocorre com os parlamentares no âmbito federal, discute-se a respeito da existência de limites à imunidade sobre opiniões, palavras e votos proferidos no exercício do mandato e no território do município.
Em decisões relativamente recentes, o Supremo Tribunal Federal tem garantido a imunidade de vereadores em relações a palavras proferidas nas dependências do Legislativo municipal.
Em 2015, após reconhecer a repercussão geral do tema no RE 600.063/SP, o tribunal firmou a seguinte tese: “Nos limites da circunscrição do Município e havendo pertinência com o exercício do mandato, os vereadores são imunes judicialmente por suas palavras, opiniões e votos” (Tema 469). À época, o plenário considerou que embora fossem ofensivas, as manifestações submetidas ao julgamento haviam sido proferidas durante a sessão da Câmara dos Vereadores — ou seja, na circunscrição do município — e haviam sido motivadas por discussões de cunho político — logo, no exercício do mandato. Como ressaltou o ministro Gilmar Mendes, se o vereador tivesse de atuar com bons modos e linguagem escorreita, não haveria necessidade de a Constituição garantir a imunidade parlamentar. Complementando, o ministro Celso de Mello afirmou que se o parlamentar comete abuso, é passível de censura da própria Casa Legislativa a que pertence.
Decisões posteriores seguiram a mesma linha:
“I – A incidência do Direito Penal deve observar seu caráter subsidiário, de ultima ratio. Nesse sentido, ofensas menores e que não estejam abarcadas pelo animus injuriandi não são reputadas crime. II – A reação do querelado ocorreu quando sua atuação política estava sendo questionada. Incide, por isso, a inviolabilidade a que alude o caput do art. 53 da Constituição Federal. III – A imunidade material em questão está amparada em jurisprudência sólida desta Corte, como forma de tutela à própria independência do parlamentar, que deve exercer seu mandato com autonomia, destemor, liberdade e transparência, a fim de bem proteger o interesse público. IV – Eventual excesso praticado pelo parlamentar deve ser apreciado pela respectiva Casa Legislativa, que é o ente mais abalizado para apreciar se a postura do querelado foi compatível com o decoro parlamentar ou se, ao contrário, configurou abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional, nos termos do art. 55, § 1º, da Constituição. V – Queixa-Crime rejeitada” (Pet 6587/DF, j. 01/08/2017).
“1. No presente caso, havendo sido evidenciada a relação entre o fato em tese ofensivo e a atividade do parlamentar, bem como tendo as declarações sido feitas nos limites da circunscrição do Município, o recorrente está abrangido pelo campo de incidência da imunidade parlamentar” (ARE 1.103.498 AgR/MS, j. 05/10/2018).
Pois uma decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo parece ter destoado da tendência seguida pelo STF. De acordo com o tribunal, a imunidade material do vereador pode ser flexibilizada ainda que suas palavras sejam proferidas nas dependências da Câmara Municipal, caso não haja relação entre o que foi falado e a atividade parlamentar propriamente dita. Considera-se que o fato de a manifestação ter sido proferida nas dependências legislativas, mesmo que na tribuna, pode ser apenas uma aparência de que se trata de algo relativo ao exercício do mandato:
“Daí que é certo que a descrição fática constante da inicial, referindo-se, em tese, à ocorrência de ilícito penal contra a honra (calúnia), não carece de justa causa, vez que os fatos narrados em principio tipificam o delito imputado ao querelado, a despeito de ter as as declarações do querelado terem sido proferidas no exercício de seu cargo de vereador durante Sessão Ordinária da Câmara Municipal, encontrando-se presente o elemento subjetivo do tipo penal em questão, pois não apenas ele declarou fatos os quais teria tomado conhecimento expressão pura e simplesmente a sua opinão, mas sim fez acusações greves contra o ora recorrente, sem, contudo, apresentar qualquer prova do alegado, evidenciando-se, assim, o dolo exigido a configura o crime de calúnia, não podendo se eximir de responsabilidade criminal por sua conduta sob a arguição de que estava protegido pela imunidade material que lhe é concedida pelo art. 29, inciso VIII, da Constituição Federal, na qual é garantida a inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município, pois tais opiniões e palavras não abrangem certamente uma grave acusação contra terceiro, como ocorreu na hipótese em tela.
Assim sendo, os elementos de prova existentes nos autos – e mesmo a narrativa apresentada na inicial acusatória – estão a demonstrar que a conduta imputada ao querelado é típica, porque realizada além de suas prerrogativas funcionais.
Além do mais, verificando-se atentamente dos fatos noticiados, não há falar que de modo inequívoco todas as declarações realizadas pelo querelado e narradas na inicial relacionam-se, inegavelmente, ao exercício de suas funções no cargo que exerce de vereador, sendo direcionadas à comunidade local, e que foram prestadas com inequívoco animus narrandi, pois, a princípio, está demonstrado que o querelado extrapolou nas atribuições atinentes ao cargo exercido.
Dessa forma não há falar em atipicidade na conduta do querelado. Assim, sendo – se verazes –, típicos os fatos, caracterizado está o crime suscitado pelo ora recorrente e, consequentemente, encontra-se presente a justa causa para o recebimento da queixa-crime e instauração da ação penal”.
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