No julgamento de questão de ordem na Ação Penal 937, o STF decidiu, sobre a prerrogativa de foro de parlamentares federais, que: 1) o foro especial se limita aos crimes cometidos no exercício do cargo e em razão dele; 2) a jurisdição do STF se perpetua caso tenha havido o encerramento da instrução processual – leia-se: intimação das partes para apresentação das derradeiras alegações – antes da extinção do mandato.
Não estava sendo submetido a julgamento o foro por prerrogativa de outras autoridades, como governadores, deputados estaduais e desembargadores. O ministro Dias Toffoli chegou a tomar a iniciativa de propor (1) que a decisão do STF se estendesse a todos os cargos sobre os quais a Constituição Federal estabelece prerrogativa de foro e (2) que os dispositivos constitucionais estaduais que dispusessem sobre a mesma prerrogativa fossem ser declarados inconstitucionais:
“Reajusto o voto proferido na sessão de ontem, para dar a ele maior extensão e resolver a questão de ordem no sentido de: (…) ii) fixar a competência por prerrogativa de foro, prevista na Constituição Federal, quanto aos demais cargos, exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação ou a nomeação (conforme o caso), independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão; iii) serem inaplicáveis as regras constitucionais de prerrogativa de foro quanto aos crimes praticados anteriormente à diplomação ou à nomeação (conforme o caso), hipótese em que os processos deverão ser remetidos ao juízo de primeira instância competente, independentemente da fase em que se encontrem; iv) reconhecer a inconstitucionalidade das normas previstas nas Constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal que contemplem hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição Federal, vedada a invocação de simetria. Nestes casos – que, conforme mencionei em meu voto na data de ontem, englobam 16.559 autoridades estaduais, distritais e municipais -, os processos deverão ser remetidos ao juízo de primeira instância competente, independentemente da fase em que se encontrem (…)”.
A proposta, no entanto, não foi encampada pela maioria dos demais ministros. Não obstante, o STJ proferiu diversas decisões nas quais afastou o foro por prerrogativa de autoridades originalmente não abrangidas pela decisão do STF.
Recentemente, no entanto, o STJ manteve o foro por prerrogativa de um desembargador apesar de se tratar de crime não vinculado ao exercício do cargo.
No caso, o desembargador havia sido acusado, perante o STJ, de ter cometido o crime de lesão corporal. Diante da decisão proferida pelo STF na AP 937, o Ministério Público Federal pediu a remessa do processo à primeira instância. Mas, por maioria, a Corte Especial do STJ rejeitou o pedido e manteve o foro especial.
De acordo com a decisão, as razões que justificam o foro por prerrogativa ultrapassam aquela utilizada pelo STF para manter o benefício nos casos em que a autoridade comete o crime no exercício do cargo e em razão dele, isto é, a liberdade e a independência no exercício das funções. Subjaz à decisão do STF, com efeito, que se o crime não é cometido no exercício do cargo nem em razão dele não se justifica a prerrogativa porque a conduta criminosa não tem ligação com a independência e a liberdade de exercer a função.
Mas, no caso de desembargadores, a Corte Especial do STJ considerou que o foro por prerrogativa não existe para garantir apenas o pleno exercício das funções do acusado, mas também para garantir que o julgador reúna as condições de imparcialidade para um julgamento adequado, o que não se verifica se acusado e julgador são vinculados ao mesmo tribunal. Segundo o ministro Benedito Gonçalves, o foro por prerrogativa de desembargadores no STJ visa a “resguardar a própria prestação jurisdicional criminal de questionamentos que, em tese, poderiam ser feitos em razão da prolação de decisões por juiz que poderá eventualmente no futuro ter interesse em decisões administrativas que dependerão de deliberação da qual venha a participar o desembargador acusado”.
A divergência – vencida – foi guiada pelo ministro Luis Felipe Salomão, para quem o foro especial só deve ser mantido se os desembargadores cometerem crimes durante o exercício do cargo e relacionados às funções judicantes. A prerrogativa não existe para garantir a imparcialidade do julgador, mas para efetivamente garantir ao acusado a independência e o livre exercício de suas funções.
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