Informativo: 618 do STJ – Processo Penal
Resumo: A cautelar fixada de proibição para que agente diplomático acusado de homicídio se ausente do país sem autorização judicial não é adequada na hipótese em que o Estado de origem do réu tenha renunciado à imunidade de jurisdição cognitiva, mas mantenha a competência para o cumprimento de eventual pena criminal a ele imposta.
Comentários:
A lei penal se aplica a todos, nacionais ou estrangeiros, por igual, sem privilégios pessoais (art. 5°, caput, e inc. I, da CF/88). Há, no entanto, pessoas que, em virtude das suas funções ou em razão de regras internacionais, gozam de imunidade. Longe de uma garantia pessoal, trata-se de necessária prerrogativa funcional, proteção ao cargo ou função desempenhada pelo seu titular.
A imunidade decorrente de regras internacionais é a diplomática, prerrogativa de direito público internacional de que desfrutam: (A) os chefes de governo ou de Estado estrangeiro e sua família e membros da sua comitiva; (B) embaixador e sua família; (C) os funcionários do corpo diplomático e família; (D) funcionários das organizações internacionais (ex: Organizações das Nações Unidas) quando em serviço.
Por se tratar de prerrogativa funcional, e não pessoal, a imunidade é irrenunciável pelo próprio agente, sendo-lhe vedado abdicar de sua prerrogativa. Não obstante, pode haver renúncia, desde que expressa, por parte do Estado de origem do agente diplomático (denominado Estado acreditante), nos termos do artigo 32, 1 e 2, do Decreto nº 56.435/65.
Ocorre que a renúncia à imunidade pode não ser completa, pois o Estado acreditante pode ceder ao acreditado apenas o juízo de conhecimento, mantendo para si a exclusividade de executar a sentença.
Com fundamento nesta circunstância, o STJ deu provimento a recurso em habeas corpus para tornar sem efeito medida cautelar que restringia o direito de ir e vir de um diplomata espanhol.
Acusado de homicídio no Brasil, o agente diplomático perdeu, diante da renúncia promovida pela Espanha, a imunidade que obstava a ação penal no país. No entanto, o Estado espanhol manteve para si a prerrogativa de executar a pena.
O juízo de primeiro grau, considerando apenas a renúncia ao processo de cognição, aplicou ao agente diplomático a medida cautelar do art. 320 do CPPArt. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas. – consistente na proibição de se ausentar do país –, “a fim de assegurar a aplicação da lei penal bem como a futura instrução processual, tendo em vista que ele, gozando de suas prerrogativas de agente diplomático, poderia facilmente retornar à seu país de origem, Espanha, ou outro país estrangeiro, o que impediria, ou pelo menos, dificultaria, a realização de novos depoimentos perante a autoridade policial, bem como seu interrogatório, caso seja instaurada ação penal”.
Mas, considerando a exclusividade do Estado espanhol para executar a pena, o STJ julgou descabida a imposição de medida cautelar destinada, na verdade, apenas a garantir a aplicação da lei penal, pois caso o agente deixasse o Brasil não haveria impedimento para a colheita de provas: “O relevante fundamento esposado na fixação da cautelar, foi assegurar a aplicação da lei penal, mas não sendo ao Brasil cabível a execução de eventual pena, resta sem razoabilidade a proteção desse risco. Falta à cautelar fixada, assim, adequação aos riscos que se pretendia com ela evitar, de modo que é de se reputar indevida a proibição do recorrente ausentar-se do país sem autorização judicial”.
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