Como já tivemos a oportunidade de destacar em outros artigos, o princípio da insignificância tem sido recorrentemente aplicado pelos tribunais superiores em diversas situações nas quais estejam reunidos a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada.
No geral, os tribunais têm considerado a atipicidade material nos delitos tributários, nos crimes ambientais em que a conduta provoque baixo impacto negativo no meio ambiente e nos crimes patrimoniais cometidos sem violência ou grave ameaça a pessoa e em circunstâncias nas quais a conduta não se revele particularmente grave. Furto qualificado, apropriação indébita majorada, receptação qualificada e estelionato previdenciário, por exemplo, têm sido considerados palcos inadequados para a insignificância porque suas circunstâncias são consideradas por demais reprováveis.
Nota-se, portanto, que a insignificância depende de determinadas condições que, para além da inexistência de agressão física ou psíquica, revelem a inofensividade da conduta num sentido amplo. Não é pelo fato de alguém ter cometido um crime sem agredir ou ameaçar outra pessoa que sua conduta pode ser considerada irrelevante para o Direito Penal. Afinal, há crimes que não envolvem nenhum perigo direto à integridade física de alguém, mas que se revestem de especial gravidade. É isso que fundamenta, além dos casos já citados, o afastamento da insignificância em delitos contra a Administração Pública ou contra a fé pública, como a falsificação de moedas.
Neste passo, o Supremo Tribunal Federal decidiu recentemente que, diante das circunstâncias da conduta submetida a julgamento, o princípio da insignificância não poderia ser aplicado no crime de operação de rádio clandestina.
O art. 183 da Lei nº 9.472/97 pune, com detenção de dois a quatro anos, a conduta de desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação.
O preceito secundário do delito já nos indica que não se trata de conduta encarada como algo de pouca relevância. O crime é de considerável potencial ofensivo, tanto que não admite nenhum dos benefícios da Lei nº 9.099/95.
E, de fato, não é algo a ser tratado com permissividade porque a operação de rádios sem concessão, permissão ou autorização de serviço no geral interfere na transmissão de outras rádios licenciadas e em outras espécies de comunicação, como entre aeronaves e torres de controle, o que evidentemente pode provocar consequências desastrosas.
Embora haja decisões do STF reconhecendo a insignificância no delito de operação de rádio clandestina, são decisões tomadas com base na comprovação de que não havia possibilidade de interferir na transmissão de outras rádios. É o caso, por exemplo, do HC 126.592/BA, julgado em 24/02/2015.
Se, no entanto, constatada – como aliás ocorre normalmente – a capacidade de interferência do equipamento clandestino, caracteriza-se o crime:
“Não há que se cogitar da incidência do princípio da insignificância na hipótese pois, conforme já decidiu esta Corte, a suposta operação de rádio clandestina em frequência capaz de interferir no regular funcionamento dos serviços de comunicação devidamente autorizados impede a aplicação” (HC 142.730/MT, j. 08/08/2017).
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