Ementa: Habeas corpus. Impetração em favor de uma coletividade de cidadãos. Indeterminação subjetiva dos pacientes. Pessoas não identificadas. A questão dos pacientes anônimos. Inobservância do requisito fundado no art. 654, § 1º, “a”, do CPP. Consequente inviabilidade de utilização do writ constitucional. Entendimento prevalecente na jurisprudência do STF. Magistério da doutrina. Ação de habeas corpus de que não se conhece.
O habeas corpus é o remédio jurídico destinado a tutelar a liberdade de locomoção do indivíduo. Protege, pois, o direito de ir, vir, ficar ou voltar. Vê-se, portanto, que se assegura o livre direito de locomoção, o jus manendi, ambulandi e undi ultro citroque, isto é, o direito de ir e vir de onde quer que se pretenda, mas diretamente relacionado ao indivíduo. Outros direitos líquidos e certos, mas que não se refiram à locomoção, podem ser amparados através de mandado de segurança, cuja aplicação é admitida no âmbito penal e que se presta, por exemplo, para liberaçãoSTJ - Rel. Ministro Fernando Gonçalves, j. em 21.09.1999, DJU de 11.10.1999, p. 89 de veículo ilegalmente apreendido. Afinal, conforme bem anotado pelo ministro Celso de MelloHC nº 86878-SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. em 25.10.2005, DJ de 04.11.2005, “a ação penal de habeas corpus, enquanto instrumento de ativação da jurisdição constitucional das liberdades, configura um poderoso meio de cessação do injusto constrangimento ao estado de liberdade de locomoção física das pessoas. Se essa liberdade não se expõe a qualquer tipo de cerceamento, e se o direito de ir, vir ou permanecer sequer se revela ameaçado, nada justifica – por não estar em causa a liberdade de locomoção física – o emprego do remédio heroico do habeas corpus”.
Para que seja viável a impetração, a petição inicial do habeas corpus deve conter, nos termos do art. 654, § 1º, a, do CPP, “o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça”.
A primeira parte do dispositivo diz respeito ao paciente, aquele em favor do qual é ajuizado o habeas corpus e que se encontra suportando uma restrição ao seu direito de locomoção ou, ao menos, uma ameaça de que tal constrangimento se verifique. É intuitivo, portanto, que o paciente deverá ser, necessariamente, a pessoa física. Segundo o ensinamento de Cretella JúniorComentários à Constituição – 1998, Rio: Forense, 1ª edição, 1992, vol. II, p. 592, “concluímos que o alguém, no habeas corpus, é apenas, e tão-só, a pessoa física, o homem, o corpus, ameaçado em sua liberdade de locomoção, ao passo que o alguém, no mandado de segurança, abrange a pessoa física e a pessoa jurídica”.
Com base nessas considerações, o STF não conheceu de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Estado do Paraná contra decisão proferida pela 5ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, que vedou, a pedido da Procuradoria do Município, a permanência de pessoas em algumas áreas da cidade, especificamente nas cercanias das instalações da Justiça Federal, nas quais ocorreria o interrogatório do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Defensoria havia impetrado o remédio heroico em favor da “coletividade formada por todas as pessoas” que desejassem “exercer seu direito de manifestação na cidade de Curitiba”.
O min. Celso de Mello, a quem foi distribuída a ação, reconheceu a importância da liberdade de reunião e de manifestação do pensamento, mas considerou não ser o habeas corpus a medida correta para viabilizar essa garantia, justamente porque se tratava de uma coletividade anônima que pretendia ocupar um espaço público, não de indivíduos que tiveram sua liberdade cerceada. O ministro ressaltou a necessidade, por expressa disposição legal, de identificar o paciente e invocou a jurisprudência do próprio tribunal e do Superior Tribunal de Justiça.
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