Súmula vinculante 46: A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa privativa da União.
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O crime de responsabilidade pode ser próprio ou impróprio. O crime de responsabilidade próprio é uma infração penal comum cometida por determinados agentes, julgada pelo Poder Judiciário, ao passo que o impróprio revela uma infração político-administrativa, em que a apreciação e a punição, ambas de ordem política (impeachment), são atribuídas ao Poder Legislativo.
Diante disso, é necessária uma boa dose de cautela com a expressão “crime de responsabilidade”. Trata-se de expressão com múltiplas acepções. Não se confundem, por exemplo, os crimes de responsabilidade previstos no art. 1º do Decreto-Lei n.º 201/67 com aqueles do art. 85 da Constituição Federal. Este artigo constitucional trata de crimes de responsabilidade do presidente da República e enumera as condutas assim consideradas. São os atos que atentem contra: a) a existência da União; b) o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; c) o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; d) a segurança interna do País; e) a probidade na administração; f) a lei orçamentária; g) o cumprimento das leis e das decisões judiciais. Como se percebe, os crimes de responsabilidade previstos na Constituição Federal não constituem infrações penais, mas sim infrações políticas. Não são, portanto, crimes em sentido estrito. Por isso, o julgamento de tais “crimes” é igualmente político, realizado pelo Senado Federal.
O crime de responsabilidade de que trata esta súmula é o impróprio, ou seja, aquele que versa sobre punições de ordem política.
A edição desta súmula vinculante decorreu, na verdade, da conversão da súmula 722, editada em 2003, que já pacificara a questão a respeito da competência privativa da União sobre a lei disciplinando os crimes de responsabilidade impróprios. A conversão ocorreu porque, a despeito da súmula então vigente, estados e municípios insistiam em aprovar leis locais tratando do tema, o que culminava na provocação do Supremo, que reiterava sua jurisprudência. Decidiu-se, então, pela súmula vinculante para obstar definitivamente a usurpação de competência.
A controvérsia a respeito dessa matéria decorre, segundo José Afonso da Silva, “de verdadeiro equívoco quanto à natureza dos chamados crimes de responsabilidade, tendo-os como de natureza penal. Se assim fosse, a competência seria mesmo da União. Mas não têm tal natureza. Constituem simples infrações político-administrativas, cuja definição legal de modo algum se inclui na competência legislativa da União, salvo quanto aos do Presidente da República. Em nenhum dispositivo da Constituição da República veda-se às Constituições estaduais regular tais infrações. Se formos ao fundo do sistema constitucional, acabaremos concluindo exatamente o contrário, isto é, no sentido de que a matéria é mesmo da competência do constituinte estadual” (Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 629/630).
O STF, no entanto, ainda que reconhecesse expressamente a relevância da doutrina de José Afonso da Silva, acompanhada pela de Paulo Brossard e de Hely Lopes Meirelles, considerou-a superada, atribuindo portanto à União a competência privativa para legislar sobre crimes de responsabilidade, competência essa fundamentada nos arts. 22, I e 85, parágrafo único, da Constituição Federal.
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